Pode-se ver como uma das diferenças entre Platão e Aristóteles o fato de que o segundo promove uma desmatematização da filosofia e da natureza em detrimento do valor que seu mestre Platão dava à matemática (Veremos agora A Astronomia de Aristóteles) Segundo nos lembra Zingano, Aristóteles diria que:
A matemática é o instrumento científico utilizado para examinar o mundo do ponto de vista de sua quantidade, mas ela não é capaz de nos dar por si só a natureza do mundo. (2005, p.65)
Dessa maneira fica claro que Aristóteles abordava a matemática a partir do ponto de vista quantitativo. Então a física de Aristóteles diferentemente do que passará a ser na modernidade é “qualitativa” e não “quantitativa” como vigora a partir de Galileu Galilei que é quem a matematiza “definitivamente”, e seus sucessores seguem o mesmo caminho. Nas palavras de Galileu: “ A matemática é a linguagem da natureza”. Veremos o momento da modernidade no próximo cápitulo.
No início do segundo capítulo do livro II da Física, Aristóteles distingue a matemática da física. Essa distinção é uma clara objeção Aristotélica afirmando que a matemática não poderia explicar os “corpos naturais” exaustivamente, nem preponderantemente. Seu objetivo também é o de saber qual é o método apropriado para o estudo da natureza. Além do mais, como lembra Angioni(6) “teorias platônicas negavam ao mundo natural enquanto natural qualquer inteligibilidade específica e reduziam seu conhecimento científico ao conheciemento matemático.” Nas palavras de Aristóteles:
… devemos examinar em que o matemático se diferencia do estudioso da natureza (pois também os corpos naturais têm superfícies e sólidos, bem como comprimentos e pontos, a respeito dos quais o matemático faz seu estudo). Além disso, devemos examinar se a astronomia é uma parte da ciência natural, ou se é distinta dela. De fato, seria absurdo se coubesse ao estudioso da natureza conhecer o que é o sol ou a lua, mas não lhe coubesse conhecer nenhum dos concomitantes que se lhes atribuem em si mesmos – principalmente porque os que estudam a natureza manifestamente se pronunciam também sobre a figura da lua e do sol, e buscam saber se a Terra e o mundo são esféricos ou não. Ora, também o matemático se ocupa desses intens, mas não enquanto cada um é limite de corpo natural; tampouco estuda os atributos enquanto sucedem aos corpos naturais tomados nessa qualidade; por isso o matemático os separa: pelo pensamento, tais itens são separáveis do movimento, e isso não faz nenhuma diferença, tampouco surge algo falso quando eles os separam. (193b22)
Aristóteles, em uma clara objeção platônica, continua: “Despercebidamente fazem isso também os que afirmam as Idéias: separam as coisas naturais, que são menos separáveis que as coisas matemáticas”. (193b35)
Do mesmo modo, Aristóteles via a natureza e a localização de um objeto como algo qualitativo, assim seria da “qualidade” de cada substância ou corpo ocupar o seu “lugar natural” e isso é o que faz parte da entelékheia de cada corpo. Então para Aristóteles, impor a um ser algo contrário à sua natureza é uma violência. É o que ocorre, por exemplo, quando retiramos uma pedra do chão, seu “lugar natural”, ao largarmos a pedra ela volta “naturalmente” para o “seu lugar”. Hierarquicamente, Aristóteles considera a Terra no centro do “universo”; à sua volta, está a água; o ar está acima da terra e da água e, enfim, acima do ar, está o último elemento atmosférico, o fogo. Portanto, o fogo e o ar sobem naturalmente, enquanto a terra e água caem naturalmente, todos em busca dos seus lugares naturais.
Não foi à toa que Aristóteles adotou a tese do geocentrismo(7) (a terra no centro do “universo”). E, como para ele o movimento é eterno, adota também a tese do movimento natural e eterno, e por a terra ser pesada teria que estar no centro, ou seja, o lugar natural de um corpo pesado. Por isso a terra estaria no centro do universo seu lugar natural. A origem desse pensamento vem da questão do mundo fechado e finito porém eterno. Para Aristóteles o universo é finito (um corpo tem que ter limites) porém ele é eterno, não foi criado, ou seja, não teve um momento de nascimento e também não terá um fim, sempre existiu e sempre existirá. A partir desse pensamento, ele defende a ideia do movimento eterno, sempre houve corpos em movimento e corpos em repouso, e a Terra por tender ao seu lugar natural, estaria em repouso no centro desse universo, enquanto os outros corpos estariam girando em movimentos circulares em torno dela.
O espaço é pleno e não há o vazio, se o vazio existisse seria o mesmo que admitir o não-ser e isso seria uma contradição lógica, dessa forma Aristóteles de maneira metafísica, justifica o “quinto elemento” ou “éter” que seria quem estaria preenchendo o espaço entre os corpos celestes e da mesma maneira esses “corpos” seriam constituídos de éter por isso não se deteriorariam, e não poderiam ter outro tipo de mutação a não ser a de translação, diferentemente do que ocorre na Terra e na região sublunar, onde os quatro elementos (terra, água, ar e fogo) esses sim passiveis de toda mutação e transformação.
Dessa maneira, Aristóteles em seu tratado Do Céu, postula uma separação “física” e “real” entre a região supralunar (acima da lua) e a sublunar (abaixo da lua, o nosso mundo). Não seria possível um material daquela região “composto de éter” vir para a Terra e nem um material do planeta Terra ir para aquela região, há assim um isolamento definitivo, o céu composto de éter (incorruptível) não poderia misturar-se com a terra. Naquela região incorruptível haveria as “esferas celestes”, explicação dada por alguns astrônomos da época e que eram apoiadas e complementadas por Aristóteles para justificar o movimento dos astros “em torno da terra”. Ali estariam girando ao redor da terra, em “círculos perfeitos”, as estrelas e os planetas(8) que estariam “colados” às esferas, cada um na sua “esfera cristalina” correspondente. Essa tese foi proposta primeiramente por Eudoxo (astrônomo da época de Aristóteles), Calipos (também da época) aumenta a quantidade de esferas e sofistica o sistema, Aristóteles com sua tese do “lugar natural” e do éter ou quinta essência, solidifica essa explicação e o geocentrismo; e posteriormente com Ptolomeu já no séc. II d.C alcança sua maior expressão no Almagesto.(9)
Para explicar esse complexo de movimentos celeste, Aristóteles recorre ao ápice de toda a sua metafísica, dizendo que há um “primeiro motor”, que é imóvel mas dá origem a todo movimento celeste.
Por fim, como dissemos, e é lembrado por Reale:
(…) a física Aristotélica (e também grande parte da cosmologia) é, na verdade, uma metafísica do sensível. Assim não é de surpreender o fato de que a Física esteja prenhe de considerações metafísicas, chegando até a culminar com a demonstração da existência de um Primeiro Motor imóvel: radicalmente convencido de que, “se não houvesse o eterno, não existiria tampouco o devir” (2004, p.209)
Com isso vemos claramente que, apesar de suas diferenças com seu mestre Platão, Aristóteles herda muito do Platonismo de maneira a não se separar do supra-sensível.
Considerações
Aristóteles implanta a lógica (começando do nada) e com ela tem um bom instrumento, um método (um caminho) para estudar a physis, a natureza, o mundo. Precisamos ter em mente a época em que Aristóteles viveu e seus poucos recursos, dessa maneira podemos perceber que ele foi um mestre e um ícone para o mundo ocidental, não só no que tange à filosofia, como também para a própria ciência.
Quanto à Astronomia de Aristóteles, abrimos um parêntesis especial para relembrar que o tempo que dura o “sistema Aristotélico”, quanto à questão do Céu, é algo que por si só merece uma reflexão. Por exemplo, o sistema geocêntrico defendido por Aristóteles dura quase dois mil anos, isso mesmo! Dois milênios… até que seja refutado pelo heliocentrismo re-introduzido definitivamente por Copérnico em 1554. (embora Copérnico, como dissemos, o tenha tomado de Aristarco de Samos (c. 310-230 a.C.)).
Outro ponto interessante é recordarmos que a separação do “mundo” em dois, sendo um supralunar (o dos astros acima da lua); e um sublunar (o nosso mundo) “aqui em baixo” com sua separação física radical, só é refutada muito tempo depois com Isaac Newton já no século XVII.
Basicamente, o conteúdo da Física de Aristóteles é a realidade sensível, na qual a ideia é inteiramente envolvida pela matéria. O físico deve possuir um acurado espírito de observação. A realidade natural, em seus aspectos mais gerais, é autônoma, contrapondo-se à espontaneidade acidental que exprime os efeitos inesperados que as coisas produzem em nós. A natureza é uma autocriação, e o ser potencial que nela atua é o movimento, o qual se apresenta, sob o aspecto quantitativo, como aumento e diminuição e, sob o aspecto espacial, como locomoção e translação.
Assim pudemos ter uma pequena ideia da importância e relevância que Aristóteles teve e tem no mundo ocidental através de seus estudos nos diversos campos do conhecimento e que ainda hoje são considerados quando falamos em Física e em Astronomia, portanto não é à toa que estamos aqui mais uma vez falando de Aristóteles.
Como veremos no ultimo capítulo, lembramos que a física contemporânea pode assemelhar-se à física primordial, no que se refere a uma metafísica no sentido de “des-conhecimento” do mundo e a busca de entender-se um mistério maior, um “primeiro motor.”
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(6) Angioni é tradutor e comentador do livro “Aristóteles Física I e II” (p.223), vide bibliografia no final desta monografia.
(7) O geocentrismo (a terra no centro do “universo”) era um pensamento quase unânime na época de Aristóteles, uma notável exceção era Aristarco de Samos (c. 310-230 a.C.) para quem o Sol estava no centro do “universo” e a terra girava em torno dele – ou seja o heliocentrismo.
(8) A palavra “Planeta” vem do grego e quer dizer “corpo errante” ou “estrela errante”, aquele que não seguia uma trajetória, não ocupava uma posição constante, ou seja não fazia parte das “estrelas fixas” no céu. Assim eram chamados de planetas não só os próprios planetas conhecidos de então: Mercúrio, Vênus, Marte, Júpiter e Saturno, como também a Lua e o Sol. É atribuída a Anaxímenes a primeira diferenciação formal entre Estrela e Planeta.
(9) Almagesto (“grande tratado”) é uma obra de Cláudio Ptolomeu composta de 13 livros e ficou famosa por seu nome árabe – Al-Majist. O intricado modelo criado por seu autor era necessário para explicar o movimento aparente dos planetas, preservando-se a ideia (equivocada) de um Universo geocêntrico. Esse modelo seria o paradigma da astronomia por 15 séculos, sendo desbancado pelo modelo heliocêntrico de Nicolau Copérnico, que por sua vez toma a ideia original de Aristarco de Samos (vide nota na página anterior).
No próximo tópico: A retomada do racionalismo na Idade Moderna e a Influência na (da) Ciência: especialmente a Astronomia/física
Abraços do Benito Pepe
[…] A Astronomia de Aristóteles […]
É meu camarada, estes símbolos que compõe o mundo fascinante da matemática (algarismo) estão dentro, num contexto geral, de todas as coisas que compõe o universo que habitamos. Viveríamos até hoje num mundo primitivo se os grandes filósofos que estudaram à matemática, não tivesse expandido seus conhecimentos e sabedorias filosóficas das ciências dos números. Também é verdade, que se não houvesse esta forma magnífica de ver e contar as coisas, o ser humano com sua mente evolutiva, teria descoberto outra maneira de enxergarmos e criarmos as coisas existentes. O Fundamentalismo filosófico da matemática, no entanto, encaixou-se dentro de um todo para o estudo das coisas, ao ponto de afirmarmos sem medo de errar, que uma coisa faz parte da outra, em outras palavras, sem a matemática, seria quase impossível entendermos as coisas do sistema universal em todo seu conteúdo. Sabemos que,o planeta Terra é o planeta Terra, que a Lua é a Lua, que o Sol é o Sol, que as estrelas são as estrelas. Mas para sabermos a qual distancia nos encontramos destes astros, e qual as suas dimensões, sem recorrermos à matemática, provavelmente, provavelmente não, é com certeza mais do que impossível. Aristóteles se dedicava ao estudo dos seres vivos e de tudo que a natureza contém, não desprezava como seu mestre, (Platão) as coisas que se apresenta aos sentidos. Mais do que isso procurava integrar a percepção do mundo sensível ao conhecimento cientifico filosófico. Ora, se o mundo inteligível é uma ficção desnecessária e inútil, só resta ao conhecimento, tornar-se o conhecimento do mundo sensível. É de imaginar, que quando Aristóteles pensou no qualitativo, estava colocando as coisas em seus devidos lugares dentro das coisas da natureza, se colocarmos uma criatura marinha, dentro de um rio de águas doce, fatalmente esta criatura não irar sobreviver, se plantamos mangas não podemos jamais colher abacates, e assim por diante. Quanto ao geocentrismo, nem sempre um corpo localizado no centro de um universo, obriga outros corpos girarem em torno de si. Tanto é verdade que depois de dois milênios, foi provado que havia duvida contra o geocentrismo Aristotélico. Por fim meu camarada, quero deixar aquele abraço do amigo J.M.Dias
Olá JM Dias, obrigado pelo comentário.
Abraços, Benito Pepe
eu so quero a astronomia de aristoteles nao a fisica
e para amanha esse trabalho que saco merda viu